29 janeiro 2004

Estórias com mural ao fundo – XXI: Como lidar com clientes difíceis

Cada vez mais, na Eurolândia, os trabalhadores que lidam com o público, em geral, e com utentes ou clientes, em particular, estão expostos a um novo tipo de violência, que pode assumir as mais diversas formas (verbal, gestual, física, psicológica). Isso acontece em todo o lado, desde as escolas e os hospitais, passando pelas caixas dos supermercados, pelas agências bancárias e pelos balcões das companhias de aviação comercial.



Segundo o III Inquérito Europeu sobre Condições de Trabalho, realizado em 2000, a uma amostra representativa dos 159 milhões de trabalhadores da União Europeia, pela Fundação Europeia para a Melhoria das Condições de Vida e de Tabalho, quase 1 em cada 10 trabalhadores (9%) reportaram ter sido objecto de intimação no ano anterior à inquirição (15% na Finlândia, 4% em Portugal); 2% queixaram-se de assédio sexual (4% nos países nórdicos, 1% na Europa do Sul); e, por fim, 4% dos trabalhadores da U.E. estiveram expostos a violência física com origem fora do local de trabalho (o dobro da violência física dentro do local de trabalho) (Paoli e Merllié, 2001).



Esta história que hoje vos conto, passou-se com uma funcionária da TAP – Air Portugal, no aeroporto de Lisboa. É uma história bem-humorada e edificante. (Obrigado, mais uma vez, ao meu amigo papa-milhas, o Anacleto M., por ma ter feito chegar à caixa de correio).



Situação: Há atrasos nos aviões. Há longas filas de espera. Há gente que protesta e se impacienta. De repente, um passageiro salta do fim da bicha e mete-se à frente de todos os outros. Atira com o bilhete para cima do balcão e diz à funcionária:

- Tenho que ir sem falta neste voo. E tenho direito a um lugar na Primeira Classe.



A funcionária responde-lhe, com bons modos:

- Meu caro senhor, farei tudo o que puder para resolver o seu problema. Mas, como compreenderá, primeiro tenho que atender todas estas pessoas que estão à sua frente. Peço-lhe que retome o seu lugar e que aguarde a sua vez.



O passageiro perdeu as estribeiras e retorquiu, em voz alta para que toda a gente o ouvisse:

- Você faz alguma ideia de quem sou eu?



Sem perder a calma, a funcionária pediu um instante, pegou no microfone e fez o seguinte anúncio:

- Peço um minuto de atenção aos senhores passageiros... Nós temos aqui um senhor passageiro que não sabe quem é, presumindo-se que esteja perdido! Se alguém é responsável pelo mesmo, se é seu parente, se é seu conhecido e se o puder ajudar a descobrir a sua identidade, solicito que compareça no balcão da TAP. Obrigada.



As pessoas atrás dele soltaram uma enorme gargalha. O homem, lívido de raiva, fuzilou com o olhar a funcionária da TAP e, rangendo os dentes, ameaçou-a:

- Filha da puta, vou-te foder!!!



Sem nunca perder o sangue frio, ela disse-lhe a sorrir:

- Desculpe, meu caro Senhor, mas até para isso vai ter que esperar a sua vez na bicha!



Moral da história: História sem moral nenhuma. Mas a senhora da TAP merece a nossa chapelada!





PAOLI, P.; MERLLIÉ, D. (2001) – Third European Survey on Working Conditions 2000. Luxembourg: Office for Official Publications of the European Communities.

Estórias com mural ao fundo – XXI: Como lidar com clientes difíceis

Cada vez mais, na Eurolândia, os trabalhadores que lidam com o público, em geral, e com utentes ou clientes, em particular, estão expostos a um novo tipo de violência, que pode assumir as mais diversas formas (verbal, gestual, física, psicológica). Isso acontece em todo o lado, desde as escolas e os hospitais, passando pelas caixas dos supermercados, pelas agências bancárias e pelos balcões das companhias de aviação comercial.

Segundo o III Inquérito Europeu sobre Condições de Trabalho, realizado em 2000, a uma amostra representativa dos 159 milhões de trabalhadores da União Europeia, pela Fundação Europeia para a Melhoria das Condições de Vida e de Tabalho, quase 1 em cada 10 trabalhadores (9%) reportaram ter sido objecto de intimação no ano anterior à inquirição (15% na Finlândia, 4% em Portugal); 2% queixaram-se de assédio sexual (4% nos países nórdicos, 1% na Europa do Sul); e, por fim, 4% dos trabalhadores da U.E. estiveram expostos a violência física com origem fora do local de trabalho (o dobro da violência física dentro do local de trabalho) (Paoli e Merllié, 2001).

Esta história que hoje vos conto, passou-se com uma funcionária da TAP – Air Portugal, no aeroporto de Lisboa. É uma história bem-humorada e edificante. (Obrigado, mais uma vez, ao meu amigo papa-milhas, o Anacleto M., por ma ter feito chegar à caixa de correio).

Situação: Há atrasos nos aviões. Há longas filas de espera. Há gente que protesta e se impacienta. De repente, um passageiro salta do fim da bicha e mete-se à frente de todos os outros. Atira com o bilhete para cima do balcão e diz à funcionária:
- Tenho que ir sem falta neste voo. E tenho direito a um lugar na Primeira Classe.

A funcionária responde-lhe, com bons modos:
- Meu caro senhor, farei tudo o que puder para resolver o seu problema. Mas, como compreenderá, primeiro tenho que atender todas estas pessoas que estão à sua frente. Peço-lhe que retome o seu lugar e que aguarde a sua vez.

O passageiro perdeu as estribeiras e retorquiu, em voz alta para que toda a gente o ouvisse:
- Você faz alguma ideia de quem sou eu?

Sem perder a calma, a funcionária pediu um instante, pegou no microfone e fez o seguinte anúncio:
- Peço um minuto de atenção aos senhores passageiros... Nós temos aqui um senhor passageiro que não sabe quem é, presumindo-se que esteja perdido! Se alguém é responsável pelo mesmo, se é seu parente, se é seu conhecido e se o puder ajudar a descobrir a sua identidade, solicito que compareça no balcão da TAP. Obrigada.

As pessoas atrás dele soltaram uma enorme gargalha. O homem, lívido de raiva, fuzilou com o olhar a funcionária da TAP e, rangendo os dentes, ameaçou-a:
- Filha da puta, vou-te foder!!!

Sem nunca perder o sangue frio, ela disse-lhe a sorrir:
- Desculpe, meu caro Senhor, mas até para isso vai ter que esperar a sua vez na bicha!

Moral da história: História sem moral nenhuma. Mas a senhora da TAP merece a nossa chapelada!


PAOLI, P.; MERLLIÉ, D. (2001) – Third European Survey on Working Conditions 2000. Luxembourg: Office for Official Publications of the European Communities.

26 janeiro 2004

Humor com humor se paga - XX: A globalização explicada às criancinhas: 'Quando passam rábanos é que é comprá-los'

Era uma vez uma princesinha inglesa, muito bonita mas infeliz, que tinha um namorado egípcio muito rico que tinha a mania que era playboy.



Aconteceu que ambos tiveram um grave acidente, do qual resultaria a sua (deles) morte, num túnel por baixo de um boulevard parisiense, num carro fabricado na Alemanha com motor montado por operários checos ex-comunistas, conduzido por um belga que bebia whisky (escocês) em demasia e que, como belga, tanto podia ser francófono como flamengo. Esse pormenor da história só interessa à polícia, incluindo os serviços secretos de sua majestade a raínha dos great britons e que é a bruxa má desta história.



E todos, a princesa e o candidato a princípe, mais o motorista belga e os guarda-costas da princesa, eram perseguidos por paparazzis italianos, em potentes motos japonesas de grande cilindrada, empunhando máquinas fotográficas japonesas com teleobjectivas de infra-vermelhos made in China, sob licença.



A princesinha, moribunda, ainda foi assistida, por uma equipa de emergência médica canadiana num grande hospital árabe de Paris, tendo-lhe sido ministrados medicamentos de uma multinacional farmacêutica, dessas sem pátria, com fábricas no Brasil.



A tecnologia de reanimação também era de uma outra multinacional que trabalhava no programa espacial da NASA (os senhores que mandam foguetões para a Lua e para Marte) e que acabava de fazer uma OPA hostil para ficar com a parte de leão do mercado da doença (Se vocês não sabem o que é uma OPA hostil, perguntem lá em casa aos paizinhos).



E eu, que sou portuga, estou-vos a contar esta história num blogue que existe na Internet, usando tecnologia desenvolvida por um senhor chamado Bill Gates e que vive na América dos cow-boys e que é podre de rico por causa da terceira vaga que ele cavalga como nenhum outro surfista do Hawai.



Vocês muito provavelmente estão a ler esta mensagem num computador que é um clone da IBM e que usa chips feitos em Taiwan, e num monitor sul-coreano, TFT de 17 polegadas, montado por trabalhadores do Bangladesh numa fábrica de Singapura, transportado em camiões TIR de uma empresa chinesa de Honk-Kong conduzidos por indianos, e que depois foram roubados (os camiões) por piratas malaios e indonésios, e descarregados por pescadores sicilianos que trabalhavam para a máfia chamada cosa nostra.



E de repente estamos numa minúscula ilha das Caraíbas onde o material (computador, monitores e demais periféricos) está a ser empacotado por campesinos mexicanos clandestinos, para depois ser transportado num porta-contentores russo de pavilhão panamiano, desembarcado em Roterdão e finalmente vendido por judeus holandeses, que escaparam ao holocausto nazi, e que até meados do Séc. XVII viviam em Portugal, prósperos, felizes e contentes.



Com eles desembarcaram, mais mortos que vivos, os novos escravos negros que fogem do inferno das costas de marfim, das libérias, das serras leoas, das guinés, dos congos. Apanhados pela polícia da eurolândia foram recambiados para as terras de fome e de morte onde nasceram.



Pois é, meus meninos, isto é que é a globalização. Convenhamos que as histórias das princesas encantadas dos tempos dos avós que se chamavam afonsinhos, eram muito mais bonitas do que esta que é triste e sórdida e imoral.



Já não me lembro do nome da princesa mas para o caso tanto faz. Em boa verdade, também não sei o verdadeiro nome dos chinos que montaram o meu computador e sem o qual eu nunca poderia comunicar com vocês que são umas encantadoras cibercriancinhas biónicas.



Se puderem escrevam um e-card com musiquinha e animação. Estamos a precisar de levantar o/a moral (desconheço o género, e não tenho aqui à mão o Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa, que passou a ser o meu livro de cabeceira e que eu uso em vez do xanax).



E ainnda a propósito, queria aqui referir um adágio popular, que existe na na terra dos portugas, e que diz: "Quando passam rábanos é que é comprá-los".



Não encontrei até à data mais feliz e sintética definição do que é essa coisa da globalização. Há uma profunda mas tranquila sabedoria neste adágio que só pode ser de origem moura porque os rábanos são cultivados pelos saloios da Estremadura lusitana e estes descendem dos mouros, como eu, os quais foram escravizados pelos feros francos cristãos da Reconquista.



Meus meninos, acabou a escola. podem ir para o recreio.

Humor com humor se paga - XX: A globalização explicada às criancinhas: 'Quando passam rábanos é que é comprá-los'

Era uma vez uma princesinha inglesa, muito bonita mas infeliz, que tinha um namorado egípcio muito rico que tinha a mania que era playboy.

Aconteceu que ambos tiveram um grave acidente, do qual resultaria a sua (deles) morte, num túnel por baixo de um boulevard parisiense, num carro fabricado na Alemanha com motor montado por operários checos ex-comunistas, conduzido por um belga que bebia whisky (escocês) em demasia e que, como belga, tanto podia ser francófono como flamengo. Esse pormenor da história só interessa à polícia, incluindo os serviços secretos de sua majestade a raínha dos great britons e que é a bruxa má desta história.

E todos, a princesa e o candidato a princípe, mais o motorista belga e os guarda-costas da princesa, eram perseguidos por paparazzis italianos, em potentes motos japonesas de grande cilindrada, empunhando máquinas fotográficas japonesas com teleobjectivas de infra-vermelhos made in China, sob licença.

A princesinha, moribunda, ainda foi assistida, por uma equipa de emergência médica canadiana num grande hospital árabe de Paris, tendo-lhe sido ministrados medicamentos de uma multinacional farmacêutica, dessas sem pátria, com fábricas no Brasil.

A tecnologia de reanimação também era de uma outra multinacional que trabalhava no programa espacial da NASA (os senhores que mandam foguetões para a Lua e para Marte) e que acabava de fazer uma OPA hostil para ficar com a parte de leão do mercado da doença (Se vocês não sabem o que é uma OPA hostil, perguntem lá em casa aos paizinhos).

E eu, que sou portuga, estou-vos a contar esta história num blogue que existe na Internet, usando tecnologia desenvolvida por um senhor chamado Bill Gates e que vive na América dos cow-boys e que é podre de rico por causa da terceira vaga que ele cavalga como nenhum outro surfista do Hawai.

Vocês muito provavelmente estão a ler esta mensagem num computador que é um clone da IBM e que usa chips feitos em Taiwan, e num monitor sul-coreano, TFT de 17 polegadas, montado por trabalhadores do Bangladesh numa fábrica de Singapura, transportado em camiões TIR de uma empresa chinesa de Honk-Kong conduzidos por indianos, e que depois foram roubados (os camiões) por piratas malaios e indonésios, e descarregados por pescadores sicilianos que trabalhavam para a máfia chamada cosa nostra.

E de repente estamos numa minúscula ilha das Caraíbas onde o material (computador, monitores e demais periféricos) está a ser empacotado por campesinos mexicanos clandestinos, para depois ser transportado num porta-contentores russo de pavilhão panamiano, desembarcado em Roterdão e finalmente vendido por judeus holandeses, que escaparam ao holocausto nazi, e que até meados do Séc. XVII viviam em Portugal, prósperos, felizes e contentes.

Com eles desembarcaram, mais mortos que vivos, os novos escravos negros que fogem do inferno das costas de marfim, das libérias, das serras leoas, das guinés, dos congos. Apanhados pela polícia da eurolândia foram recambiados para as terras de fome e de morte onde nasceram.

Pois é, meus meninos, isto é que é a globalização. Convenhamos que as histórias das princesas encantadas dos tempos dos avós que se chamavam afonsinhos, eram muito mais bonitas do que esta que é triste e sórdida e imoral.

Já não me lembro do nome da princesa mas para o caso tanto faz. Em boa verdade, também não sei o verdadeiro nome dos chinos que montaram o meu computador e sem o qual eu nunca poderia comunicar com vocês que são umas encantadoras cibercriancinhas biónicas.

Se puderem escrevam um e-card com musiquinha e animação. Estamos a precisar de levantar o/a moral (desconheço o género, e não tenho aqui à mão o Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa, que passou a ser o meu livro de cabeceira e que eu uso em vez do xanax).

E ainnda a propósito, queria aqui referir um adágio popular, que existe na na terra dos portugas, e que diz: "Quando passam rábanos é que é comprá-los".

Não encontrei até à data mais feliz e sintética definição do que é essa coisa da globalização. Há uma profunda mas tranquila sabedoria neste adágio que só pode ser de origem moura porque os rábanos são cultivados pelos saloios da Estremadura lusitana e estes descendem dos mouros, como eu, os quais foram escravizados pelos feros francos cristãos da Reconquista.

Meus meninos, acabou a escola. podem ir para o recreio.