20 outubro 2004

(Ex)citações de cada dia - XII: Deus não é republicano nem democrata

1. Há uma petição a correr na América e na Net, que eu também subscrevo, sem reservas: Deus não toma partido nos assuntos terrenos, não é de esquerda ou de direita, não é republicano ou monárquico, não é cristão nem muçulmano, não é americano nem europeu...



Deus, ou o deus que nós, homens, criámos, só pode ser suprapartidário, estar acima das nossas pequenas tricas, conflitos, paixões, sacanices, preconceitos, afectos, opções, sentimentos, ideias e até provérbios... Mesmo quando eu digo "Deus escreve direito por linhas tortas", eu não posso estar a insinuar que Deus gosta mais dos dextros do que dos canhotos... Pois aí estou a matar Deus ou a própria ideia de Deus, estou a cometer um deicídio...



Na América, "God is Not a Republican or a Democrat!": é o título da petição mais popular dos últimos dias, veiculada pelo The Petition Site, uma iniciativa levada a cabo pelo Portal Care2.com (2,5 milhões de membros).



É bom que se saiba, sobretudo em altura de campanha eleitoral para a tão ambicionada Casa Branca, que Deus não dá orientações de voto, contrariamente ao que pregam os papas e as papisas da Direita Religiosa: "Leaders of the Religious Right mistakenly claim that God has taken a side in this election, and that Christians should only vote for George W. Bush".



Os autores da petição acham, e só posso estar de acordo com eles, que "claims of divine appointment for the President, uncritical affirmation of his policies, and assertions that all Christians must vote for his re-election constitute bad theology and dangerous religion". É, de facto, má teologia e pior religião pôr os votos de todos os cristãos no cesto do Bush.



2. Em suma, são os valores, estúpido, são os valores que devem ditar o teu sentido de voto:



"We believe that sincere Christians and other people of faith can choose to vote for President Bush or Senator Kerry - for reasons deeply rooted in their faith.



"We believe all candidates should be examined by measuring their policies against the complete range of Christian ethics and values.



"We will measure the candidates by whether they enhance human life, human dignity, and human rights; whether they strengthen family life and protect children; whether they promote racial reconciliation and support gender equality; whether they serve peace and social justice; and whether they advance the common good rather than only individual, national, and special interests".



E mais, não deves ser votante de uma única causa... "We are not single-issue voters". E há tantas questões em aberto, tantas questões pendentes para as quais é preciso encontrar uma resposta urgente e justa: a pobreza, o perdão da dívida dos países mais pobres, o ambiente, a guerra e a paz, a verdade, os direitos humanos, a resposta ao terrorismo, a vida humana, o aborto, a pena capital, a eutanásia, o HIV/ Sida, etc. ... tudo isto mexe com valores, logo são questões éticas (e religiosas)...



"We believe that poverty - caring for the poor and vulnerable - is a religious issue. Do the candidates' budget and tax policies reward the rich or show compassion for poor families? Do their foreign policies include fair trade and debt cancellation for the poorest countries? (Matthew 25:35-40, Isaiah 10:1-2)".



"We believe that the environment - caring for God's earth - is a religious issue. Do the candidates' policies protect the creation or serve corporate interests that damage it? (Genesis 2:15, Psalm 24:1)".



"We believe that war - and our call to be peacemakers - is a religious issue. Do the candidates' policies pursue "wars of choice" or respect international law and cooperation in responding to real global threats? (Matthew 5:9)".



"We believe that truth-telling is a religious issue. Do the candidates tell the truth in justifying war and in other foreign and domestic policies? (John 8:32)".



"We believe that human rights - respecting the image of God in every person - is a religious issue. How do the candidates propose to change the attitudes and policies that led to the abuse and torture of Iraqi prisoners? (Genesis 1:27)".



"We believe that our response to terrorism is a religious issue. Do the candidates adopt the dangerous language of righteous empire in the war on terrorism and confuse the roles of God, church, and nation? Do the candidates see evil only in our enemies but never in our own policies? (Matthew 6:33, Proverbs 8:12-13 )".



"We believe that a consistent ethic of human life is a religious issue. Do the candidates' positions on abortion, capital punishment, euthanasia, weapons of mass destruction, HIV/AIDS-and other pandemics-and genocide around the world obey the biblical injunction to choose life? (Deuteronomy 30:19)".



Deus não tomou partido sobre estas questões, mas os seus clérigos, os que usam o seu nome em vão, os que falam abusivamente em seu nome, os fundamentalistas de todas as religiões, a começar pelos fundamentalistas cristãos:



"We also admonish both parties and candidates to avoid the exploitation of religion or our congregations for partisan political purposes.



"By signing this statement, we call Christians and other people of faith to a more thoughtful involvement in this election, rather than claiming God's endorsement of any candidate.



"This is the meaning of responsible Christian citizenship"...



Gosto desta última frase, faz sentido, é lapidar, tem pica: pode ser-se cristão e exercer uma cidadania cristã... responsável. Eu, que não sou cristão, às vezes incomodo-me por certos cristãos puxarem a manta do céu toda para o seu lado...



A verdade é que eu até agora nunca tinha realizado quanto os Génesis ou Mateus eram tão decisivos para o sucesso de uma campanha eleitoral como na grande democracia americana... God Bless America!

(Ex)citações de cada dia - XII: Deus não é republicano nem democrata

1. Há uma petição a correr na América e na Net, que eu também subscrevo, sem reservas: Deus não toma partido nos assuntos terrenos, não é de esquerda ou de direita, não é republicano ou monárquico, não é cristão nem muçulmano, não é americano nem europeu...

Deus, ou o deus que nós, homens, criámos, só pode ser suprapartidário, estar acima das nossas pequenas tricas, conflitos, paixões, sacanices, preconceitos, afectos, opções, sentimentos, ideias e até provérbios... Mesmo quando eu digo "Deus escreve direito por linhas tortas", eu não posso estar a insinuar que Deus gosta mais dos dextros do que dos canhotos... Pois aí estou a matar Deus ou a própria ideia de Deus, estou a cometer um deicídio...

Na América, "God is Not a Republican or a Democrat!": é o título da petição mais popular dos últimos dias, veiculada pelo The Petition Site, uma iniciativa levada a cabo pelo Portal Care2.com (2,5 milhões de membros).

É bom que se saiba, sobretudo em altura de campanha eleitoral para a tão ambicionada Casa Branca, que Deus não dá orientações de voto, contrariamente ao que pregam os papas e as papisas da Direita Religiosa: "Leaders of the Religious Right mistakenly claim that God has taken a side in this election, and that Christians should only vote for George W. Bush".

Os autores da petição acham, e só posso estar de acordo com eles, que "claims of divine appointment for the President, uncritical affirmation of his policies, and assertions that all Christians must vote for his re-election constitute bad theology and dangerous religion". É, de facto, má teologia e pior religião pôr os votos de todos os cristãos no cesto do Bush.

2. Em suma, são os valores, estúpido, são os valores que devem ditar o teu sentido de voto:

"We believe that sincere Christians and other people of faith can choose to vote for President Bush or Senator Kerry - for reasons deeply rooted in their faith.

"We believe all candidates should be examined by measuring their policies against the complete range of Christian ethics and values.

"We will measure the candidates by whether they enhance human life, human dignity, and human rights; whether they strengthen family life and protect children; whether they promote racial reconciliation and support gender equality; whether they serve peace and social justice; and whether they advance the common good rather than only individual, national, and special interests".

E mais, não deves ser votante de uma única causa... "We are not single-issue voters". E há tantas questões em aberto, tantas questões pendentes para as quais é preciso encontrar uma resposta urgente e justa: a pobreza, o perdão da dívida dos países mais pobres, o ambiente, a guerra e a paz, a verdade, os direitos humanos, a resposta ao terrorismo, a vida humana, o aborto, a pena capital, a eutanásia, o HIV/ Sida, etc. ... tudo isto mexe com valores, logo são questões éticas (e religiosas)...

"We believe that poverty - caring for the poor and vulnerable - is a religious issue. Do the candidates' budget and tax policies reward the rich or show compassion for poor families? Do their foreign policies include fair trade and debt cancellation for the poorest countries? (Matthew 25:35-40, Isaiah 10:1-2)".

"We believe that the environment - caring for God's earth - is a religious issue. Do the candidates' policies protect the creation or serve corporate interests that damage it? (Genesis 2:15, Psalm 24:1)".

"We believe that war - and our call to be peacemakers - is a religious issue. Do the candidates' policies pursue "wars of choice" or respect international law and cooperation in responding to real global threats? (Matthew 5:9)".

"We believe that truth-telling is a religious issue. Do the candidates tell the truth in justifying war and in other foreign and domestic policies? (John 8:32)".

"We believe that human rights - respecting the image of God in every person - is a religious issue. How do the candidates propose to change the attitudes and policies that led to the abuse and torture of Iraqi prisoners? (Genesis 1:27)".

"We believe that our response to terrorism is a religious issue. Do the candidates adopt the dangerous language of righteous empire in the war on terrorism and confuse the roles of God, church, and nation? Do the candidates see evil only in our enemies but never in our own policies? (Matthew 6:33, Proverbs 8:12-13 )".

"We believe that a consistent ethic of human life is a religious issue. Do the candidates' positions on abortion, capital punishment, euthanasia, weapons of mass destruction, HIV/AIDS-and other pandemics-and genocide around the world obey the biblical injunction to choose life? (Deuteronomy 30:19)".

Deus não tomou partido sobre estas questões, mas os seus clérigos, os que usam o seu nome em vão, os que falam abusivamente em seu nome, os fundamentalistas de todas as religiões, a começar pelos fundamentalistas cristãos:

"We also admonish both parties and candidates to avoid the exploitation of religion or our congregations for partisan political purposes.

"By signing this statement, we call Christians and other people of faith to a more thoughtful involvement in this election, rather than claiming God's endorsement of any candidate.

"This is the meaning of responsible Christian citizenship"...

Gosto desta última frase, faz sentido, é lapidar, tem pica: pode ser-se cristão e exercer uma cidadania cristã... responsável. Eu, que não sou cristão, às vezes incomodo-me por certos cristãos puxarem a manta do céu toda para o seu lado...

A verdade é que eu até agora nunca tinha realizado quanto os Génesis ou Mateus eram tão decisivos para o sucesso de uma campanha eleitoral como na grande democracia americana... God Bless America!

17 outubro 2004

Portugas que merecem os nossos assobios - V: O presidente da Câmara Municipal de Pombal

1. Esta história é triste e não honra o poder autárquico, não honra a democracia portuguesa. Sabemos que o poder, todo o poder, corrompe; e que, se não houver liberdade de opinião e de expressão, o poder pode tornar-se discriccionário, arbitrário, até mesmo despótico e totalitário... E então acontecem casos como este, agora denunciado pela própria vítima, o cidadão Orlando Cardoso, que criou e alimentou um blogue, ao que parece incómodo para muita gente, lá na sua terra, em Pombal.



Esta história, triste e exemplar ao mesmo tempo, circula por e-mail entre os cibernautas. Não ouvi as duas partes, como mandam as regras mais elementares da investigação da verdade e da justiça. Mas eu aqui não sou jornalista, muito menos juiz. Para prevenir a falsa notícia e a falsa identidade, limitei-me a apurar que a história foi previamente confirmada pelo próprio e que o e-mail é autêntico. De qualquer modo, em caso de dúvida, eu tenho por princípio dar razão à vítima, ao cidadão indefeso, ao réu.



2. Para o Orlando Cardoso, cidadão, e bloguista, que eu não conheço pessoalmente, vão as minhas palmas e a minha solidariedade; para o seu censor e o seu carrasco, o presidente da Câmara Municipal de Pombal, que eu também não conheço, vão os meus assobios. Aqui fica o relato, aqui fica, no mínimo, a suspeita das ligações perigosas entre os políticos e as empresas, as autarquias e os empregadores, e sobretudo uma lição sobre como é difícil exercer o poder autárquico em democracia... Não é para todos: só pode ser para os melhores, só deveria ser para os melhores...



Eu sei que isto é a "petite histoire" mas a história com H grande da nossa democracia pós-25 de Abril também vai ser feita com estes casos da pequena história. Que infelizmente não são pontuais: o peso do caciquismo local ainda é muito forte por essas terras do Portugal mais profundo (e do menos profundo)...



3. Três recomendações à cibernavegação na blogosfera lusófona: (i) Façam vocês, cibernautas, os juízos de valor que entenderem no grande espaço de liberdade que (ainda) é a Net; (ii) tenham cuidado com o que escrevem nos blogues; (iii) o bloguista também se dve reger por príncipios éticos na produção e divulgação dos seus "posts"; e sobretudo (iv) não amem em demasia a vossa terra que ela pode tornar-se a vossa madrasta, qual Jocasta dotada de "vagina dentata"...



O pobre Marquês de Pombal, se fosse vivo, ou se pudesse voltar à terra, depois de ter caído em desgraça, teria seguramente muito que ensinar aos nossos autarcas, e sobretudo ao nosso homem de Pombal...



__________________



Exmo. Sr. ou Sra.:



Vem isto a propósito do caso Prof. Marcelo Rebelo de Sousa.



Nasci e tenho vivido num pequeno concelho (Pombal) do Litoral-Centro (Distrito de Leiria). Não milito em nenhum grupo partidário. Sou um simples cidadão nascido seis anos antes do 25 de Abril de 1974.



E como cidadão, ingénuo a pensar que haveria liberdade de expressão e de opinião, criei em Julho passado um "blog" na Internet que pretendia ser um espaço de reflexão e de debate de ideias, com críticas construtivas, sobre o que está a acontecer na minha Terra. Nomeadamente sobre a actividade da respectiva Câmara Municipal e outras instituições. Esse "blog" num espaço de dois meses registou mais de 6.700 visitas, tendo sido comentado em grande número por outros cidadãos/munícipes.



A respectiva autarquia, presidida pelo social-democrata Eng. Narciso Mota, nunca usou o princípio do contraditório. Apesar de reconhecer que alguns dos temas abordados tinham a sua veracidade, alterou alguns procedimentos, dando razão ao que por lá se escrevia.



Reconhecendo que o "blog" era incómodo para o Poder (leia-se, Câmara Municipal), o senhor presidente entendeu que a melhor forma de usar o "contraditório" era acabar com o mesmo. Vai daí, entrou em contacto com a direcção/administração da empresa onde eu trabalhava e denunciou a sua existência, fazendo ver que o "blog" era "gerido" em horas de expediente.



A direcção da empresa de imediato, e justificando que aquela situação lesava a relação institucional com a Câmara Municipal, até porque necessitava desta para legalizar algumas situações pendentes, despediu-me.



Isto, não argumentando com falta de profissionalismo ou de produtividade. Mas sim, porque o senhor presidente da Câmara assim os contactou para o efeito. Esclareci a situação e comprometi-me a eliminar de imediato o "blog", o que foi feito e aceite. Precisamente um mês depois, e pelo meio alguns encontros realizados entre o presidente da Câmara e a direcção/administração da empresa, fui novamente confrontado com o despedimento. E perante duas opções: instauração de processo disciplinar ou demissão voluntária, optei pela segunda.



Ou seja, a intervenção do senhor presidente da Câmara Municipal de Pombal neste processo é um facto. Tanto o é que um dos seus vereadores afirmou perante algumas pessoas "já acabámos com o blog".



Esta situação é notoriamente idêntica à que aconteceu com o Prof. Marcelo Rebelo de Sousa. Na sua proporção, obviamente. Mas, com um senão... o meu futuro. Estou desempregado, com duas crianças de 20 meses para criar, casa e carro para pagar. E esposa também desempregada.



E tanto mais que, ainda há dias, ouvi da boca de um eventual empregador: "reconheço que és a pessoa indicada para o meu projecto, mas quando o senhor presidente da Câmara soubesse, caía o Carmo e a Trindade. E eu não quero ter problemas com esse senhor".



É triste que 30 anos depois de uma revolução, ainda haja quem de uma forma nojenta e vergonhosa censure as vozes discordantes para que estas não expressem livremente as suas opiniões.



Com os melhores cumprimentos



Atentamente



Orlando Manuel S. Cardoso



________________________________



Rua Paul Harris, nº 13 - 1º Esq

3100-502 Pombal

Telef.: 236213594 - 936354363

E-mail: orlando.cardoso@zmail.pt

Portugas que merecem os nossos assobios - V: O presidente da Câmara Municipal de Pombal

1. Esta história é triste e não honra o poder autárquico, não honra a democracia portuguesa. Sabemos que o poder, todo o poder, corrompe; e que, se não houver liberdade de opinião e de expressão, o poder pode tornar-se discriccionário, arbitrário, até mesmo despótico e totalitário... E então acontecem casos como este, agora denunciado pela própria vítima, o cidadão Orlando Cardoso, que criou e alimentou um blogue, ao que parece incómodo para muita gente, lá na sua terra, em Pombal.

Esta história, triste e exemplar ao mesmo tempo, circula por e-mail entre os cibernautas. Não ouvi as duas partes, como mandam as regras mais elementares da investigação da verdade e da justiça. Mas eu aqui não sou jornalista, muito menos juiz. Para prevenir a falsa notícia e a falsa identidade, limitei-me a apurar que a história foi previamente confirmada pelo próprio e que o e-mail é autêntico. De qualquer modo, em caso de dúvida, eu tenho por princípio dar razão à vítima, ao cidadão indefeso, ao réu.

2. Para o Orlando Cardoso, cidadão, e bloguista, que eu não conheço pessoalmente, vão as minhas palmas e a minha solidariedade; para o seu censor e o seu carrasco, o presidente da Câmara Municipal de Pombal, que eu também não conheço, vão os meus assobios. Aqui fica o relato, aqui fica, no mínimo, a suspeita das ligações perigosas entre os políticos e as empresas, as autarquias e os empregadores, e sobretudo uma lição sobre como é difícil exercer o poder autárquico em democracia... Não é para todos: só pode ser para os melhores, só deveria ser para os melhores...

Eu sei que isto é a "petite histoire" mas a história com H grande da nossa democracia pós-25 de Abril também vai ser feita com estes casos da pequena história. Que infelizmente não são pontuais: o peso do caciquismo local ainda é muito forte por essas terras do Portugal mais profundo (e do menos profundo)...

3. Três recomendações à cibernavegação na blogosfera lusófona: (i) Façam vocês, cibernautas, os juízos de valor que entenderem no grande espaço de liberdade que (ainda) é a Net; (ii) tenham cuidado com o que escrevem nos blogues; (iii) o bloguista também se dve reger por príncipios éticos na produção e divulgação dos seus "posts"; e sobretudo (iv) não amem em demasia a vossa terra que ela pode tornar-se a vossa madrasta, qual Jocasta dotada de "vagina dentata"...

O pobre Marquês de Pombal, se fosse vivo, ou se pudesse voltar à terra, depois de ter caído em desgraça, teria seguramente muito que ensinar aos nossos autarcas, e sobretudo ao nosso homem de Pombal...

__________________

Exmo. Sr. ou Sra.:

Vem isto a propósito do caso Prof. Marcelo Rebelo de Sousa.

Nasci e tenho vivido num pequeno concelho (Pombal) do Litoral-Centro (Distrito de Leiria). Não milito em nenhum grupo partidário. Sou um simples cidadão nascido seis anos antes do 25 de Abril de 1974.

E como cidadão, ingénuo a pensar que haveria liberdade de expressão e de opinião, criei em Julho passado um "blog" na Internet que pretendia ser um espaço de reflexão e de debate de ideias, com críticas construtivas, sobre o que está a acontecer na minha Terra. Nomeadamente sobre a actividade da respectiva Câmara Municipal e outras instituições. Esse "blog" num espaço de dois meses registou mais de 6.700 visitas, tendo sido comentado em grande número por outros cidadãos/munícipes.

A respectiva autarquia, presidida pelo social-democrata Eng. Narciso Mota, nunca usou o princípio do contraditório. Apesar de reconhecer que alguns dos temas abordados tinham a sua veracidade, alterou alguns procedimentos, dando razão ao que por lá se escrevia.

Reconhecendo que o "blog" era incómodo para o Poder (leia-se, Câmara Municipal), o senhor presidente entendeu que a melhor forma de usar o "contraditório" era acabar com o mesmo. Vai daí, entrou em contacto com a direcção/administração da empresa onde eu trabalhava e denunciou a sua existência, fazendo ver que o "blog" era "gerido" em horas de expediente.

A direcção da empresa de imediato, e justificando que aquela situação lesava a relação institucional com a Câmara Municipal, até porque necessitava desta para legalizar algumas situações pendentes, despediu-me.

Isto, não argumentando com falta de profissionalismo ou de produtividade. Mas sim, porque o senhor presidente da Câmara assim os contactou para o efeito. Esclareci a situação e comprometi-me a eliminar de imediato o "blog", o que foi feito e aceite. Precisamente um mês depois, e pelo meio alguns encontros realizados entre o presidente da Câmara e a direcção/administração da empresa, fui novamente confrontado com o despedimento. E perante duas opções: instauração de processo disciplinar ou demissão voluntária, optei pela segunda.

Ou seja, a intervenção do senhor presidente da Câmara Municipal de Pombal neste processo é um facto. Tanto o é que um dos seus vereadores afirmou perante algumas pessoas "já acabámos com o blog".

Esta situação é notoriamente idêntica à que aconteceu com o Prof. Marcelo Rebelo de Sousa. Na sua proporção, obviamente. Mas, com um senão... o meu futuro. Estou desempregado, com duas crianças de 20 meses para criar, casa e carro para pagar. E esposa também desempregada.

E tanto mais que, ainda há dias, ouvi da boca de um eventual empregador: "reconheço que és a pessoa indicada para o meu projecto, mas quando o senhor presidente da Câmara soubesse, caía o Carmo e a Trindade. E eu não quero ter problemas com esse senhor".

É triste que 30 anos depois de uma revolução, ainda haja quem de uma forma nojenta e vergonhosa censure as vozes discordantes para que estas não expressem livremente as suas opiniões.

Com os melhores cumprimentos

Atentamente

Orlando Manuel S. Cardoso

________________________________

Rua Paul Harris, nº 13 - 1º Esq
3100-502 Pombal
Telef.: 236213594 - 936354363
E-mail: orlando.cardoso@zmail.pt