28 fevereiro 2005

Portugas que merecem as nossas palmas - XIV: Os profissionais de saúde do Centro de Saúde de Fernão Ferro

1. O Expresso, de 18 de Fevereiro último, em vésperas de eleições legislativas, dedicou um dossiê ao "Portugal que funciona" (sic), nos mais diversos sectores: a saúde, a educação, o ambiente, a justiça, a indústria, a política, a sociedade civil...

Vitor Rainho, editor da revista "Única", diz que "não faltam exemplos de sucesso no Portugal dito sem rumo", e cita entre outros o centro de saúde de Fernão Ferro, no concelho do Seixal, onde "não existem listas de espera" e onde os responsáveis "uniram esforços para conseguir atender uma população envelhecida". O texto é da jornalista Graça Rosendo: "Serviço à medida das pessoas" (leia-se: possibilidade de marcar consultas pelo telefone, visitas domiciliárias, cuidados continuados, cuidados integrados e personalizados, participação comunitária, coooperação intersectorial, organização do trabalho por equipas pluridisciplinares e pluriprofissionais...).

Numa freguesia com 15 mil habitantes, o centro de saúde, ou melhor, a extensão de saúde de Fernão Ferro do Centro de Saúde do Seixal tem seis médicos de família (falta um para garantir a cobertura total da população), os quais aderiram em 1996, juntamente com os seus colegas enfermeiros, administrativos e auxiliares, ao "Projecto Alfa", uma iniciativa inovadora lançada pelo Ministério da Saúde.

Escreve a jornalista: "A ideia era mesmo essa: que os profissionais dos centros de saúde se juntassem e, em equipa, assumissem a responsabilidade pela organização e pela prestação dos cuidados de saúde primários, 'garantindo mais satisfação a todas as partes'(...). Hoje Fernão Ferro é o único Projecto Alfa vivo. Com mais do que provas dadas".

2. Há três anos que só se ouve falar em empresarialização dos hospitais, em hospitais sociedades anónimas, em doentes, em listas de espera, em programas de recuperação de listas de espera, em parcerias público/privado, em unidades de missão... Há três anos que os centros de saúde, os cuidados de saúde primários, a protecção e a promoção da saúde, os sistemas locais de saúde, a saúde mental dos portugueses, a saúde mental comunitária e outros termos do glossário da moderna saúde pública, desapareceram do discurso do poder.

O ministro da tutela nos dois últimos governos ignorou, olimpicamente, os centros de saúde, os cuidados de saúde primários, os profissonais que lá trabalham, muitas vezes em condições bem duras, com insuficientes recursos humanos, técnicos e financeiros, muitas vezes sem um tostão para comprar uma máquina de café ou o café para a máquina ou mandar reparar o telefone, entalados entre os constrangimentos burocráticos do poder central e as dramáticas pressões da procura por parte de uma população, pobre, envelhecida e abandonada, trabalhando em vãos de escada, fazendo das casa de banho arquivos, sem tempo nem papel para fazer os dossiês clínicos, sem computadores, sem internet, com gente aos berros nos corredores e nas escadas de prédios dos anos 60 e 70, de má qualidade, que já foram caixas dos serviços médico-sociais da previdência estadonovista, nas periferias tristes e cinzentas da grande cidade anónima...

Fernão Ferro é um exemplo, discreto, da muita competência e generosidade de que são capazes os profissionais de saúde que trabalham nos nossos centros de saúde, instituições que estão muito próximas do quotidiano dos portugueses e das comunidades onde estes vivem, dormem, respiram, trabalham, amam, riem, sofrem e choram. Fernão Ferro não é um exemplo único. Mas é exemplar. Ainda bem que o Expresso lhe deu a merecida visibilidade mediática.

3. Eu, por mim, aplaudo: estes e estas portugas, a começar pela directora Maria da Luz Pereira (que eu não conheço pessoalmente), merecem as minhas palmas, as nossas palmas. O seu exemplo é o melhor tónico contra o miserabilismo, o masoquismo e o populismo que minaram a nossa vida política nos últimos anos e até a confiança nas nossas próprias capacidades de realização. Fernão Ferro é, por fim, um exemplo de liderança e de trabalho em equipa, de determinação e de estratégia, que é o que nos tem faltado a todos os níveis, em muitos sectores: gente que pense globalmente, que pense grande, e que aja localmente, que saiba também tomar o peso e a medida das pequenas coisas que é preciso fazer todos os dias, que saiba fazer as pequenas coisas que é preciso fazer todos os dias... Na saúde, na educação, no ambiente, na produção, na cultura...

Fernão Ferro, a sua equipa, os seus médicos, os seus enfermeiros, os seus administrativos e restante pessoal, não vêm nas capas nas revistas côr de rosa, nem são notícia de telejornal por más razões... Mas hoje eles merecem as minhas palmas, as nossas palmas...

Portugas que merecem as nossas palmas - XIV: Os profissionais de saúde do Centro de Saúde de Fernão Ferro

1. O Expresso, de 18 de Fevereiro último, em vésperas de eleições legislativas, dedicou um dossiê ao "Portugal que funciona" (sic), nos mais diversos sectores: a saúde, a educação, o ambiente, a justiça, a indústria, a política, a sociedade civil...

Vitor Rainho, editor da revista "Única", diz que "não faltam exemplos de sucesso no Portugal dito sem rumo", e cita entre outros o centro de saúde de Fernão Ferro, no concelho do Seixal, onde "não existem listas de espera" e onde os responsáveis "uniram esforços para conseguir atender uma população envelhecida". O texto é da jornalista Graça Rosendo: "Serviço à medida das pessoas" (leia-se: possibilidade de marcar consultas pelo telefone, visitas domiciliárias, cuidados continuados, cuidados integrados e personalizados, participação comunitária, coooperação intersectorial, organização do trabalho por equipas pluridisciplinares e pluriprofissionais...).

Numa freguesia com 15 mil habitantes, o centro de saúde, ou melhor, a extensão de saúde de Fernão Ferro do Centro de Saúde do Seixal tem seis médicos de família (falta um para garantir a cobertura total da população), os quais aderiram em 1996, juntamente com os seus colegas enfermeiros, administrativos e auxiliares, ao "Projecto Alfa", uma iniciativa inovadora lançada pelo Ministério da Saúde.

Escreve a jornalista: "A ideia era mesmo essa: que os profissionais dos centros de saúde se juntassem e, em equipa, assumissem a responsabilidade pela organização e pela prestação dos cuidados de saúde primários, 'garantindo mais satisfação a todas as partes'(...). Hoje Fernão Ferro é o único Projecto Alfa vivo. Com mais do que provas dadas".

2. Há três anos que só se ouve falar em empresarialização dos hospitais, em hospitais sociedades anónimas, em doentes, em listas de espera, em programas de recuperação de listas de espera, em parcerias público/privado, em unidades de missão... Há três anos que os centros de saúde, os cuidados de saúde primários, a protecção e a promoção da saúde, os sistemas locais de saúde, a saúde mental dos portugueses, a saúde mental comunitária e outros termos do glossário da moderna saúde pública, desapareceram do discurso do poder.

O ministro da tutela nos dois últimos governos ignorou, olimpicamente, os centros de saúde, os cuidados de saúde primários, os profissonais que lá trabalham, muitas vezes em condições bem duras, com insuficientes recursos humanos, técnicos e financeiros, muitas vezes sem um tostão para comprar uma máquina de café ou o café para a máquina ou mandar reparar o telefone, entalados entre os constrangimentos burocráticos do poder central e as dramáticas pressões da procura por parte de uma população, pobre, envelhecida e abandonada, trabalhando em vãos de escada, fazendo das casa de banho arquivos, sem tempo nem papel para fazer os dossiês clínicos, sem computadores, sem internet, com gente aos berros nos corredores e nas escadas de prédios dos anos 60 e 70, de má qualidade, que já foram caixas dos serviços médico-sociais da previdência estadonovista, nas periferias tristes e cinzentas da grande cidade anónima...

Fernão Ferro é um exemplo, discreto, da muita competência e generosidade de que são capazes os profissionais de saúde que trabalham nos nossos centros de saúde, instituições que estão muito próximas do quotidiano dos portugueses e das comunidades onde estes vivem, dormem, respiram, trabalham, amam, riem, sofrem e choram. Fernão Ferro não é um exemplo único. Mas é exemplar. Ainda bem que o Expresso lhe deu a merecida visibilidade mediática.

3. Eu, por mim, aplaudo: estes e estas portugas, a começar pela directora Maria da Luz Pereira (que eu não conheço pessoalmente), merecem as minhas palmas, as nossas palmas. O seu exemplo é o melhor tónico contra o miserabilismo, o masoquismo e o populismo que minaram a nossa vida política nos últimos anos e até a confiança nas nossas próprias capacidades de realização. Fernão Ferro é, por fim, um exemplo de liderança e de trabalho em equipa, de determinação e de estratégia, que é o que nos tem faltado a todos os níveis, em muitos sectores: gente que pense globalmente, que pense grande, e que aja localmente, que saiba também tomar o peso e a medida das pequenas coisas que é preciso fazer todos os dias, que saiba fazer as pequenas coisas que é preciso fazer todos os dias... Na saúde, na educação, no ambiente, na produção, na cultura...

Fernão Ferro, a sua equipa, os seus médicos, os seus enfermeiros, os seus administrativos e restante pessoal, não vêm nas capas nas revistas côr de rosa, nem são notícia de telejornal por más razões... Mas hoje eles merecem as minhas palmas, as nossas palmas...